Eu não sou como os outros!
(…) A partir de um bebé inconsciente, inacabado, fomos, pouco a pouco, fabricados por todos os contributos do mundo que nos rodeia. Lançando mão de todos os recursos, devorando tudo, desenvolvemo-nos sem preocupações, às cegas, empanturrados de papas, de conselhos, de bandas desenhadas, de afecto, de repreensões e de televisão.
Chega então a idade em que olhamos para nós próprios: quem é este ser em que me transformei? O que é que ele vale? (…) Vemo-nos ao espelho (…) Serei belo? Serei inteligente?
A resposta a estas perguntas lancinantes é: diferente dos outros. Eu não sou como os outros. É claro, porque o meu património genético, fruto de uma dupla lotaria, é único; como o é única a aventura que vivo.
O que tenho em comum com todos os outros é o poder de, a partir do que recebi, participar da minha própria criação. (…) E para isso contribuíram os meus pais, cujos óvulo e espermatozóide continham todas as receitas de fabricação das substâncias que me constituem. E a minha família, pelo alimento, pelo calor, pelo afecto, que me permitiram crescer e estruturar-me. E a escola que me transmitiu conhecimentos acumulados pela humanidade desde que esta procura conhecer-se e conhecer o universo. E todos os que me amaram, com o seu insubstituível amor.
Mas sou eu que tenho de concluir a obra, que tenho de colocar a trave mestra. Esqueçam o modelo que gostariam que eu fosse. Não sou obrigado a realizar o sonho que imaginaram para mim; isso seria trair a minha natureza de homem.
Para que eu seja verdadeiramente um homem, devem oferecer-me mais uma coisa: a liberdade de vir a ser o que escolhi.
A. Jacquard, O Meu Primeiro Livro de Genética
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